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O Imperador e o Nefilim


O povo delirou quando viu no centro do estádio um homem grande e extremamente forte preso por dez correntes; ele se debatia, mas os grilhões não permitiam muita movimentação. Havia duas longas correntes presas ao braço direito, duas presas ao braço esquerdo, duas na perna direita, duas na esquerda, uma no pescoço e uma última na cintura do homem.
Cada uma das correntes media cerca de três metros e estavam sendo seguras por soldados romanos que à distância lutavam contra a força do cativo.
Uma voz soou no centro da tribuna imperial e chamou a atenção de todos quando anunciou a entrada do imperador. O delírio se tornou êxtase, as pessoas gritavam porque sabiam que o espetáculo já ia começar.
O imperador Marco Úlpio Nerva Trajano apareceu na tribuna acompanhado por sua guarda particular, os pretorianos. Vestia sua característica armadura de soberano do exército, cujo peitoral talhado pelos melhores artífices romanos ostentava os desenhos em ouro de um anjo e um homem, um em cada lado de uma pira; acima daquele desenho havia também a face do que se pensava ser júpiter.

Uma grande e vistosa capa vermelho sangue, aveludada, também fazia parte do traje imperial, ela era toda bordada com detalhes dourados assim como uma belíssima túnica na mesma cor que ele usava por baixo da armadura. Por fim, o imperador trazia em sua cabeça uma coroa de louros confeccionada em outro puro e maciço.
Trajano era aclamado pelo povo porque chegou ao poder supremo do grande Império Romano depois de cumprir difíceis etapas. Nascido em itálica, na Bética, sul da Hispania; de família nobre, comandou uma legião na própria Hispania e participou das campanhas na Germânia. Foi nomeado cônsul por Domiciano. O imperador Nerva  o adotou como seu sucessor e quando assumiu o poder foi amplamente apoiado pela guarda pretoriana.
Embora não tivesse muito tempo para se dar às batalhas no Coliseu, naquele dia ele fez questão de ver o homem de quem seus guardiões falavam tão insistentemente.
A multidão gritou, urrou e aplaudiu quando na arena entraram mais dois gladiadores e um senhor idoso.
Trajano se assentou no trono de mármore e ouro localizado entre colunas grossas, ao seu lado alguns senadores observavam atentos a movimentação dos guerreiros no centro da arena.
O imperador levantou a mão direita, deixando a mostra um grosso bracelete dourado e todos na platéia calaram-se quase que instantaneamente.
O senhor idoso que entrou junto com os dois gladiadores trazia na mão alguns apetrechos de batalha; um capacete, uma faca curta, uma rede e um tridente com cabo longo. Esse senhor se aproximou do prisioneiro, que não o agrediu, e depositando as coisas no chão libertou-o das correntes uma a uma em seguida voltou-se para a multidão que olhava tudo aquilo de disse:
_ Romanos! Contemplem esse gladiador; filho de netuno, sobrinho de Júpiter e marte, trazido cativo das terras da Grécia.
O prisioneiro quando se viu livre recolheu do chão a faca, a rede; colocou o capacete que lhe encobria o rosto e esperou.
A voz do Imperador foi ouvida por todos.
_ Gladiador_ disse Trajano_ Hoje daremos uma oportunidade a você, vença esses oponentes na arena e deixará de ser um prisioneiro para ocupar uma posição de destaque na guarda pretoriana.
Aquele convite não estava sendo feito por mero acaso, a fama daquele homem já tinha passado para fora dos muros do grande Coliseu; todos sabiam que ele tinha sido capturado em uma das campanhas na Grécia; falava-se que anos antes das legiões romanas chegaram em Atenas, muitos dos cidadãos locais viram o confronto entre aquele homem e o próprio Fobos, um dos filhos de Marte, senhor das guerras. Fobos teria perdido a batalha, mas por vingança, marte teria enviado os exércitos romanos à Grécia e uma centúria especialmente para prendê-lo.
Verdade ou mito, o certo era que aquele homem vencia sucessivamente cada batalha que disputava, suas forças eram superiores as dos demais homens, assim como sua altura e velocidade. Por esse motivo foi acertado entre os generais pretorianos que aquela chance seria dada a ele, não poderiam descartar uma força como aquela para os planos futuros da guarda e do próprio exército nas duras campanhas de conquista dos demais povos.
Tanto o público quanto o próprio imperador Trajano queriam vê-lo em ação. O velho gritou mais uma vez:
_ De agora em diante não haverá romano ou estrangeiro que vai chamá-lo de gladiador, pois que seu nome é Crisaor!
A multidão explodiu em gritos novamente:
_ Crisaor! Crisaor! _Gritavam eles em uníssono.
O guerreiro ergueu do chão o tridente e com o braço esticado segurando as lâminas voltadas para o céu recebia a saudação do público ensandecido.
_ Que comece a prova!_ Bradou o imperador.
Após a saída do velho que anunciou o combate, mais oito outros gladiadores adentraram a arena, dois de cada categoria de gladiadores, havia trácios, Murmillos, Retiários e Secutores; cada um deles extremamente bem armado, seguravam seus gládios, que eram as espadas da época, redes, escudos tridentes e facas.
Crisaor voltou-se para seus oponentes e sob o som ensurdecedor dos gritos da multidão, atacou com tanta violência e precisão que muitos na platéia se assustaram, dez homens não eram suficientes para deter aquele combatente grego.
Roma não via um homem com tanta habilidade em combate desde Espartacus. O imperador, os senadores e os líderes da guarda pretoriana não tinham mais dúvida, Crisaor seria elevado ao posto de Pretoriano e teria a incumbência de proteger Trajano, receberia todas as honras de um herói inclusive uma estátua em sua homenagem.
Mais tarde Crisaor foi transferido por seu próprio pedido para uma das frentes de batalha na campanha vitoriosa contra o império Parto onde ganhou muitas batalhas e prestígio, tornou-se um dos maiores dentre os centuriões. O fato é que o império Romano alcançou sob o governo de Trajano, sua máxima extensão.
Com a morte do imperador e a ascenção de seu filho adotivo e sobrinho, o Imperador Adriano; Crisaor não foi mais visto, falava-se que ele teria rumado para terras mais longínquas para não servir ao novo imperador porque sabia de um suposto plano para levar Adriano ao poder.
Entre os que o conheceram, dizia-se que era imortal, pelas coisas que o viram fazer em campo, porém, Crisaor nunca mais foi visto desde então e pouquíssimos relatos sobre sua existência sobreviveram ao tempo.
O homem tornou-se a lenda, a lenda tornou-se o mito e o mito, desapareceu.

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